domingo, 8 de fevereiro de 2015

RELIGIÃO+ PARA HUMANIDADE+


Além de divulgar conteúdo próprio, parte da missão da página "Transhumanismo Cristão" é divulgar conteúdo em português sobre o fenômeno do Transhumanismo e sua relação com as Religiões humanas, especialmente o Cristianismo. A ideia já tem tomado significativas proporções e alimentado sérias discussões e Fóruns, tanto Teológicos como Científicos, na América do Norte e Europa, mas parece que tal discussão ainda se encontra em estado embrionário no Brasil, principalmente devido a falta de disponibilidade de conteúdo em português.


Se estiver interessado em saber mais a respeito, seja bem-vindo.



Atendendo à nossa missão, segue abaixo a tradução do interessantíssimo artigo "RELIGION+ FOR HUMANITY+" publicado pelo Reverendo Presbiteriano Christopher Benek, onde ele discorre sobre a interessante concepção da Religião aplicada ao contexto futurista do Transhumanismo, e como os dois universos possuem total sinergia e complementação, contrapondo a ideia do ateu Zoltan Istvan que defende enfaticamente que o Transhumanismo é um fenômeno essencialmente ateu.

Segue o artigo traduzido:

RELIGIÃO+ PARA HUMANIDADE+


No início de dezembro do ano passado, Zoltan Istvan escreveu um artigo para o Huffington Post, intitulado Sou ateu, logo, sou Transhumanista. Nesse artigo Istvan mostra a proposta de que muitas pessoas dentre os um bilhão de “individuos sem-Deus -- ateus, agnósticos, e não associados à religião” são transhumanistas; eles só não sabem disso ainda. Eu discordo de Istvan e não penso que transhumanistas devam dispensar o que as religiões tradicionais têm a oferecer ao movimento transhumanista.


De início, eu gostaria de afirmar que praticamente e filosoficamente, nenhuma pessoa é desligada da religião em geral, ainda que não admita ser adepto de uma religião organizada. A evidência do enraizamento da religião na cultura humana é um fato indiscutível. Isso não quer dizer que uma pessoa tenha de estar pessoalmente satisfeita com as atuais opções de religiões organizadas que estão disponíveis, mas negar o impacto da religião na cultura não é uma proposição muito científica.


Adicionalmente, falando tanto no sentido técnico quanto prático, ninguém é ateu. A origem da palavra "ateísmo" é derivada do grego ἄθεος, essencialmente significa "sem deus(es)." E se nós investigarmos, mesmo que superficialmente, a alegação de que um ser humano consegue ser sem-deus(es), vemos que isso é uma contradição a respeito de quem somos como pessoas.


Afinal, podemos ver isso porque a definição de "deus" pode ser colocada simplesmente como: "uma pessoa ou coisa que é excessivamente cultuada e admirada; uma paixão arrebatadora, um busca, obsessão, ou hobby, algo idolatrado". Por definição, “excesso” é simplesmente uma quantidade ou qualidade maior do que o necessário, e o “culto”, em sua forma mais básica, significa ter uma ardente devoção ou adoração para alguma coisa. Isso significa que, para uma coisa ser considerada “deus”, basta que ela seja, de forma exagerada, o centro da sua preocupação real ou substancial, como uma paixão, ambição, ou hobby.


Como resultado, qualquer coisa pode ser um deus/ídolo - seja uma ideia, seja o fato de assistir demais a jogos de futebol, seja um ligeiro excesso de apreço por um instinto, ou até mesmo por uma estátua dourada de um bezerro. Os antigos entendiam esse conceito claramente e aceitavam tal raciocínio como comum e lógico. Nós até encontramos evidência histórica disto no primeiro e segundo mandamentos. Então, nesse sentido, ninguém pode genuina ou logicamente ser um ateu.

Se por “ateu” entendemos “pessoas não aceitam ou acreditam em um Ser Supremo, ou em um entendimento de Deus proposto por uma tradição religiosa tradicional”, então isso é um uso diferente da palavra. Tal definição ainda não nega o que foi dito anteriormente; ela simplesmente requer que fundamentalmente reconheçamos a nós mesmos como idólatras. Ela pode inclusive, para uma pessoa que tende a acreditar em fatos e dados científicos, deixar aberta a opção de agnosticismo fora de uma religião organizada. Mesmo assim, o simples fato de que todos nós temos deuses em nossas vidas e que nós os adoramos - mesmo de forma muito básica - demonstra que todos nós somos seres religiosos.

Este não é um conceito novo, é uma compreensão teológica básica de tempos antigos. Mas isso levanta uma questão maior:

Será que devemos considerar a possibilidade de que as tradições religiosas podem ter algo a oferecer para o movimento transhumanista?

E é nesse ponto que tenho delineado minha crítica ao artigo de Istvan de forma mais incisiva. Apesar de Istvan afirmar que os “sem-deus” não estão “em posição de criticar a religião”, sua motivação real parece ser exatamente a de converter transhumanistas em ateus, em vez de convencer os ateus em transhumanistas. Isso para mim parece ser mais de um jogo de poder para controlar o movimento transhumanista, eu gostaria de afirmar que esse tipo de atitude não faz parte do espírito do transhumanismo.

Permitam-me explicar o porquê:
Istvan promove sua noção de uma Aposta Transhumanista - uma ideia de que “todos nós no século 21 devemos decidir o quão longe estamos dispostos a ir no sentido de usar a tecnologia e a ciência para melhorar nossas vidas". Ele acredita que "os sem-deus" devem ser aqueles que tomarão essas decisões. Ele continua a dizer que muitas pessoas “sem-deus” se tornarão os defensores da "indefinida extensão da vida e das tecnologias que eliminam nossa humanidade e promovem a nossa transhumanidade". Ele defende essa ideia porque ele explica que, para ele, a palavra transhumano significa "além do humano".

Mas tal posição pressupõe que temos uma definição sobre o que é a condição humana em sua totalidade - mas esta é uma proposição totalmente especulativa na melhor das hipóteses. No mínimo, devemos considerar a possibilidade de que o nosso progresso evolutivo em direção a uma maior utilização de ferramentas e tecnologia pode implicar que parte do que ele realmente entender por “ser humano” inclui uma evolução em direção a um estado de ser que é melhor do que a forma como existimos atualmente.

Esse conceito está totalmente alinhado com muitas tradições religiosas que divulgam a noção de que parte da nossa missão de ser humano é justamente a viagem em direção a uma forma mais aperfeiçoada, ou um estado eterno. Dessa forma, o prefixo "trans" tem um significado mais sutil que implica ir "através" do escopo do que pode significar ser humano. Não é uma perda de nossa humanidade, e sim um melhoramento dela.

Tal idéia não está em conflito com Transhumanismo ou a maioria das tradições religiosas, que basicamente defendem a melhoria holística de pessoas. Indo mais fundo, o conceito de superar limitações humanas fundamentais (muitas vezes referido nas tradições religiosas como “pecado”) também é um objetivo que compartilhamos.

Além disso, Istvan afirma que o "herói transhumanista" é o indivíduo que "se empenha constantemente em melhorar sua saúde, estilo de vida e longevidade com a ciência e tecnologia". Na sua opinião, essas pessoas não são "simpáticas àquelas ideias ultrapassadas que mobilizam os indivíduos através da culpa, a se tornarem diferentes ou melhores do que são ou do que eram quando nasceram -- ou se tornarem à imagem de Deus". No entanto, é nesta declaração que Istvan revela o que ele realmente quer para adorar - ele próprio. E essa noção está fundamentalmente em desacordo com a maioria das religiões organizadas do mundo.

+Humanidade implica, nas origens da sua pluralidade, que a vindoura jornada tecnológica não é do tipo que se caminha sozinho. Isso implica um uso ético e útil de tecnologias emergentes para melhorar os seres humanos COLETIVAMENTE e, da mesma forma, melhorar os nossos entendimentos sobre o que fundamentalmente significa ser humano. Isso implica uma abordagem comunitária, uma viagem que faremos juntos, através do qual faremos a humanidade melhor. Nas questões de melhoria da comunidade, as tradições religiosas possuem séculos de experiência prévia e muito a oferecer para a discussão.

Nesse sentido, há duas preocupações éticas pertinentes, de caráter religioso, que devemos nos proteger e evitar que ocorram no movimento transhumanista, e são: a idolatria/adoração de indivíduos e a ideia de alienação do “outro”. Pois assim que criamos deuses a partir de nós mesmos, a nossa autoabsorção nos desumaniza, separando-nos de nossa comunidade relacional maior. Oferecer tal conceito de idolatria (ou autoidolatria) como apogeu da humanidade é, na minha opinião, -Humanidade e não +Humanidade."

O reverendo Christopher Benek é um pastor na Igreja Presbiteriana Providence em Hilton Head Island, SC , EUA . Ele detém M.Div.(Mestrado em Divinidades) e Th M. (Mestrado em Teologia) Graduações em Ética no Seminário Teológico de Princeton e está terminando graduação de Ciência e Teologia no Seminário Teológico de Pittsburgh DMIN.



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